sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Obsessions: Oprah's saving the best for last

By Lisa Respers France, CNN
December 2, 2010 2:26 p.m. EST

(CNN) -- Tom Franklin has never met Oprah Winfrey, but that didn't stop him from dreaming what most writers dream.

"With her Mississippi roots, I kept fantasizing that she would see the title, say 'I know what that means, I'm from there' and pick up the book," said the author of "Crooked Letter, Crooked Letter." "I'm really sad because she got so many people to read and was doing such good work."

Many Oprah fans in general are saddened by her looming departure from her daytime talk show. But that sorrow has also been tempered this season with a bit of mania over the show that, after 25 years, has become a staple of Americana. In the world of television, there is no one bigger than the "O."

The talk show host has helped to stoke the flames of the excitement in the waning days of her show by delivering episodes that are seemingly bigger, better and brighter than anything she has ever done.

From reuniting the cast from "The Sound of Music," to scoring interviews with Michael Jackson's ex-wife, parents and children, and surprising Barbra Streisand with a visit from Robert Redford, Winfrey is going out with a bang the likes of which television audiences have never seen.

Todd Gold, managing editor of Fancast, said all of the excitement befits the ending of the reign of the "queen of television." Gold said he imagines Winfrey and her producers have put a great deal of imagination and energy into thrilling her audience each episode.

'She's going nuts," Gold said. "She's going for it. This is her final lap and it's just going to build and build every day."

Crazy over her "Oprah's Favorite Things" episode? Well, this season Winfrey delighted fans with not one, but two shows and sent her audience members into a frenzy with such high-end gifts as an iPad, a cruise and a 2012 Volkswagen Beetle.
"She's going for it. This is her final lap and it's just going to build and build every day."
--Todd Gold of Fancast.com

"It isn't even a new Volkswagen, it's a Volkswagen from two years from now that hasn't even been made yet and was only seen by Oprah," said Gold. "And isn't that so Oprah? You didn't even have to be there [in the audience] to be thrilled by those episodes because all of the excitement just spilled over from watching it."

That excitement has also translated to ratings gold. According to The Hollywood Reporter, "The Oprah Winfrey Show" averaged 8.3 million viewers for the week of November 8, up from the average of 7 million viewers a week who have been watching since the final season began in September, according to Gold's site.

When the talk show host announced a year ago that she would end "The Oprah Winfrey Show" in September 2011 after a quarter century on the air, it not only set off a mad scramble among viewers to get tickets; potential guests also felt the pressure to get on that golden stage, which has served as a launching pad for success for everyone from doctors to small-business owners.

The New York Times reported that one aspiring writer even started blogging her attempt to get her book published before Oprah leaves the airwaves.

"It's not just that she had the Midas touch and everything she touches turns to gold," said Susan Harrow, media coach and author of the book "How to Get Booked on Oprah." "It's that people are invested in Oprah and they really see her as someone whose opinion matters to them. People who follow Oprah, they want to know what she thinks, what she's eating, what she's wearing, because if she's doing it it's got to be important to them."

And that obsession with Winfrey has only intensified as the remaining months tick down.

Shelly Jystad is a member of the Bookworms, a book club which recently headed to the show in Chicago, Illinois, from Jamestown, North Dakota, for the episode featuring best-selling author Jonathan Franzen.

The group was thrilled with the chance to be in the audience, which Jystad said included a 100-year-old fan who had followed Winfrey's career, and the gift of a free Amazon Kindle e-reader to every audience member.

Jystad said Winfrey's success has been aided by being so easy to relate to and so open to sharing her own struggles. "Part of it is knowing her journey," she said. "She's been able to overcome so much, and I think she is very genuine in her desire to help others achieve their dreams."

And Jystad said she doesn't believe Winfrey's influence will cease, simply because the talk show host won't be on the air.

"I think she will just be influencing people through another venue with her new network," she said.

But fan Monique Merritt, 26, said she has grown up with the show and doubts that there will ever be another like it. Even as Winfrey moves on to the next stage of her career, heading up the OWN Network, Merritt said she doesn't think the venture will be able to garner the same interest Winfrey has every day for the last 25 years.

"She talks about so much that happens in the world and she hits so many important points," Merritt said. "It's not just a talk show. The new network is cool, but it's not the same as seeing her every day at 4 o'clock."

terça-feira, 17 de agosto de 2010

O Operário Em Construção, de Vinicius de Moraes

E o Diabo, levando-o a um alto monte, mostrou-lhe num momento de tempo todos os reinos do mundo. E disse-lhe o Diabo:
– Dar-te-ei todo este poder e a sua glória, porque a mim me foi entregue e dou-o a quem quero; portanto, se tu me adorares, tudo será teu.
E Jesus, respondendo, disse-lhe:
– Vai-te, Satanás; porque está escrito: adorarás o Senhor teu Deus e só a Ele servirás.
Lucas, cap. V, vs. 5-8.

Era ele que erguia casas
Onde antes só havia chão.
Como um pássaro sem asas
Ele subia com as casas
Que lhe brotavam da mão.
Mas tudo desconhecia
De sua grande missão:
Não sabia, por exemplo
Que a casa de um homem é um templo
Um templo sem religião
Como tampouco sabia
Que a casa que ele fazia
Sendo a sua liberdade
Era a sua escravidão.

De fato, como podia
Um operário em construção
Compreender por que um tijolo
Valia mais do que um pão?
Tijolos ele empilhava
Com pá, cimento e esquadria
Quanto ao pão, ele o comia...
Mas fosse comer tijolo!
E assim o operário ia
Com suor e com cimento
Erguendo uma casa aqui
Adiante um apartamento
Além uma igreja, à frente
Um quartel e uma prisão:
Prisão de que sofreria
Não fosse, eventualmente
Um operário em construção.

Mas ele desconhecia
Esse fato extraordinário:
Que o operário faz a coisa
E a coisa faz o operário.
De forma que, certo dia
À mesa, ao cortar o pão
O operário foi tomado
De uma súbita emoção
Ao constatar assombrado
Que tudo naquela mesa
– Garrafa, prato, facão –
Era ele quem os fazia
Ele, um humilde operário,
Um operário em construção.
Olhou em torno: gamela
Banco, enxerga, caldeirão
Vidro, parede, janela
Casa, cidade, nação!
Tudo, tudo o que existia
Era ele quem o fazia
Ele, um humilde operário
Um operário que sabia
Exercer a profissão.

Ah, homens de pensamento
Não sabereis nunca o quanto
Aquele humilde operário
Soube naquele momento!
Naquela casa vazia
Que ele mesmo levantara
Um mundo novo nascia
De que sequer suspeitava.
O operário emocionado
Olhou sua própria mão
Sua rude mão de operário
De operário em construção
E olhando bem para ela
Teve um segundo a impressão
De que não havia no mundo
Coisa que fosse mais bela.

Foi dentro da compreensão
Desse instante solitário
Que, tal sua construção
Cresceu também o operário.
Cresceu em alto e profundo
Em largo e no coração
E como tudo que cresce
Ele não cresceu em vão
Pois além do que sabia
– Exercer a profissão –
O operário adquiriu
Uma nova dimensão:
A dimensão da poesia.

E um fato novo se viu
Que a todos admirava:
O que o operário dizia
Outro operário escutava.

E foi assim que o operário
Do edifício em construção
Que sempre dizia sim
Começou a dizer não.
E aprendeu a notar coisas
A que não dava atenção:

Notou que sua marmita
Era o prato do patrão
Que sua cerveja preta
Era o uísque do patrão
Que seu macacão de zuarte
Era o terno do patrão
Que o casebre onde morava
Era a mansão do patrão
Que seus dois pés andarilhos
Eram as rodas do patrão
Que a dureza do seu dia
Era a noite do patrão
Que sua imensa fadiga
Era amiga do patrão.

E o operário disse: Não!
E o operário fez-se forte
Na sua resolução.

Como era de se esperar
As bocas da delação
Começaram a dizer coisas
Aos ouvidos do patrão.
Mas o patrão não queria
Nenhuma preocupação
– "Convençam-no" do contrário –
Disse ele sobre o operário
E ao dizer isso sorria.

Dia seguinte, o operário
Ao sair da construção
Viu-se súbito cercado
Dos homens da delação
E sofreu, por destinado
Sua primeira agressão.
Teve seu rosto cuspido
Teve seu braço quebrado
Mas quando foi perguntado
O operário disse: Não!

Em vão sofrera o operário
Sua primeira agressão
Muitas outras se seguiram
Muitas outras seguirão.
Porém, por imprescindível
Ao edifício em construção
Seu trabalho prosseguia
E todo o seu sofrimento
Misturava-se ao cimento
Da construção que crescia.

Sentindo que a violência
Não dobraria o operário
Um dia tentou o patrão
Dobrá-lo de modo vário.
De sorte que o foi levando
Ao alto da construção
E num momento de tempo
Mostrou-lhe toda a região
E apontando-a ao operário
Fez-lhe esta declaração:
– Dar-te-ei todo esse poder
E a sua satisfação
Porque a mim me foi entregue
E dou-o a quem bem quiser.
Dou-te tempo de lazer
Dou-te tempo de mulher.
Portanto, tudo o que vês
Será teu se me adorares
E, ainda mais, se abandonares
O que te faz dizer não.

Disse, e fitou o operário
Que olhava e que refletia
Mas o que via o operário
O patrão nunca veria.
O operário via as casas
E dentro das estruturas
Via coisas, objetos
Produtos, manufaturas.
Via tudo o que fazia
O lucro do seu patrão
E em cada coisa que via
Misteriosamente havia
A marca de sua mão.
E o operário disse: Não!

– Loucura! – gritou o patrão
Não vês o que te dou eu?
– Mentira! – disse o operário
Não podes dar-me o que é meu.

E um grande silêncio fez-se
Dentro do seu coração
Um silêncio de martírios
Um silêncio de prisão.
Um silêncio povoado
De pedidos de perdão
Um silêncio apavorado
Com o medo em solidão.

Um silêncio de torturas
E gritos de maldição
Um silêncio de fraturas
A se arrastarem no chão.
E o operário ouviu a voz
De todos os seus irmãos
Os seus irmãos que morreram
Por outros que viverão.
Uma esperança sincera
Cresceu no seu coração
E dentro da tarde mansa
Agigantou-se a razão
De um homem pobre e esquecido
Razão porém que fizera
Em operário construído
O operário em construção.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Eu não sou da sua rua

Eu não sou da sua rua
Eu não sou o seu vizinho
Eu moro muito longe, sozinho
Estou aqui de passagem
Esse mundo não é meu
Esse mundo não é seu

Eu não sou da sua rua
Eu não falo a sua língua
Minha vida é diferente da sua
Estou aqui de passagem
Esse mundo não é
Meu, esse mundo não é seu

Branco Mello e Arnaldo Antunes

quinta-feira, 23 de julho de 2009

O lago do cisne — depois da seca

Da Folha:

25/02/2009 - 09h51
Resgate de cisne mobiliza frequentadores de parque da Aclimação

LAURA CAPRIGLIONE
da Folha de S.Paulo

O macho e a fêmea de cisne negro nadavam juntos no momento em que o fundo do lago da Aclimação abriu-se e 78 milhões de litros d'água começaram a desabar em um redemoinho cujo vórtex apontava para o córrego da Pedra Azul, que deságua no Tamanduateí, que deságua no Tietê.

Ralo adentro rolaram peixes, tartarugas e, muitos frequentadores do parque da Aclimação juram tê-lo visto, aves aquáticas. Quando quase todo o lago já tinha sido sugado, e apenas uma fina lâmina d'água restava recobrindo o fundo, milhares de peixes pulavam desesperados, tentando sair do atoleiro.

No meio da confusão, os dois cisnes assistiam a tudo, pescoços colados. "Eles estavam como que hipnotizados. Nem tentavam fugir", lembrava ontem Romilda Queiroz, 67, professora aposentada, chorando os acontecimentos da véspera.

Ontem, o casal de cisnes separou-se. O macho foi capturado ao se aproximar da margem do lago. Enviaram-no para o Viveiro Manequinho Lopes, no parque Ibirapuera, local que recebeu as aves flageladas (patos, marrecos, gansos, além do cisne). Faltou uma.

O cisne fêmea driblou todas as tentativas feitas até as 18h de ontem para capturá-lo. Refugiou-se no meio do ex-lago, cercado por poças d'água agora recheadas de peixes mortos --cascudos, tilápias, carpas coloridas, carpas-de-espelho e até mussuns, espécimes de corpo cilíndrico, parecidos com enguias ou moreias.

Resgate

"O cisne está atolado." Ninguém sabia se estava, mas a fêmea, parada por horas no meio do pântano, indicava isso, e o murmúrio espalhou-se.

Frequentadores do parque exigiam que a polícia fizesse um resgate da ave à la Rambo --helicóptero em voo estacionário, um Rambo descendo de rapel até o animal.

A saída foi cogitada porque, antes, alguns voluntários e guardas civis metropolitanos já haviam tentado alcançar a fêmea --andando. Afundaram na lama. O lago converteu-se em armadilha movediça. Ir de barco também não dava, não havia água suficiente --encalhava.

Foi quando apareceu Edmir Rabello, radialista "patriota e voluntário" na autodefinição. Chapéu camuflado de pescador, bermudas, botas de mergulhador e uma boia imensa feita com câmara de pneu de caminhão, ele parecia um aqualouco, mas tinha uma ideia na cabeça: ser conduzido por cordas --de boia-- até o cisne, e assim capturá-lo.

Por volta das 15h, as centenas de pessoas que assistiam à agonia do bicho soltaram um óóóóóó uníssono. A ave tinha se movido. Foram poucos centímetros, mas ok. Ela não estava atolada.

A estratégia mudou. Esticou-se uma corda de uma margem à outra do lago. Homens em joggings limpinhos, frequentadores do parque, ofereciam-se para ajudar a agitar a corda, de modo a "arrastar" a ave até a margem coalhada de lixo urbano --pneus velhos, sapatos, garrafas, e latinhas que apareceram depois que a água baixou.

O "arrastão" na lama envolveu até quem achava a estratégia bizarra, como o músico Luís Guilherme de Mattos, 28, guitarrista e violonista, que terminou imundo e com as mãos lanhadas. "Achei um pouco rústico demais. Mas eu senti que devia ajudar, e fui."

Até que funcionou e o bicho foi bonitinho para a margem. O que ninguém sabia, porque paulistano que é bom não sabe nada de natureza, é que os cisnes são exímios voadores.
Quando o homem com a rede se aproximou da ave, ela abriu as asas imensas (aí se viram as pontas brancas) e voou, linda, de volta para o meio do lago sem água. Os espectadores, até ali calados, irromperam em aplausos e gritos de alegria.

Quietinha, a funcionária que cuida dos banheiros do parque há 14 anos, Agustia Maria, 37, picava bem miudinho um pão francês. "Deixa essa confusão parar. Daqui a pouco ela vem comer na minha mão, como vem todos os dias."

A Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente, responsável pela administração do parque da Aclimação, não sabia informar ontem à noite se, quando ou como será feita nova tentativa de resgate da ave. A noite passada ela passou sozinha no lago sem água.

Sobre o editor William Shawn

Do Atlantic Online:

The mystery of William Shawn's origins -- a source of considerable curiosity in the literary world throughout Shawn's long career -- is finally solved by one of his writers

Introduction by Ian Frazier

WILLIAM Shawn worked at The New Yorker magazine for fifty-four years. He began there in 1933, became the editor in 1952, and left in 1987, when a company that had bought the magazine forced him to resign. His tenure as editor coincided, roughly, with the years of the Cold War. It is safe to say that he was the pre-eminent magazine editor in the world during that time. Among his gifts was a faultless ear for Cold War-era apocalyptic, audible in the titles of famous works he edited, such as Hiroshimaand Silent Spring and The Fate of the Earth and The Fire Next Time. Mostly, though, his tastes in writing were hard to categorize. He published the stories and novels of J. D. Salinger, and Truman Capote's true-crime classic, In Cold Blood, and movie reviews by Pauline Kael that changed not just movie reviewing but reviewing in general. And E. B. White and Hannah Arendt and Edmund Wilson and Milan Kundera and Elizabeth Bishop, Joseph Brodsky and Harold Brodkey and Donald Barthelme and Janet Flanner and S. J. Perelman, George Steiner and Peter Handke and Philip Roth and Jamaica Kincaid and John McPhee and Joseph Mitchell -- the list of distinguished writers he published could go on and on. He loved new writing, read quickly, and almost always knew what to do to a piece to make it better. Often his editing amounted to an inspired sort of doing nothing, of just letting a piece run. Harold Ross, The New Yorker's founder and first editor, always referred to himself simply as "Ross,"and so did everybody else. Perhaps following that tradition, his successor called himself and signed himself "Shawn."A contributor might pick up his telephone and hear the small voice at the other end say, "Shawn here."But the contributor always replied, "Hello, Mr. Shawn." The honorific "Mr." seems to have been awarded him by popular acclaim among his colleagues out of respect, and in deference to his own politeness. He was a shy, formal man, and he took self-effacement so far that he met megalomania coming back the other way. He seldom talked about himself -- people who worked with him for decades knew little more of his biography than the few facts anyone could read about him in Who's Who. He gave almost no interviews, and almost never let himself be photographed. No record that he ever made a speech in public can be found. Harold Ross sometimes gave away studio head shots of himself on which he had scrawled personalized epigrams. Shawn would not have done that in a million years. His style was a pervasive anonymity, and negative capability in the extreme.

Probably he would have preferred that nobody write anything about him after he was gone. Probably, but not certainly -- he lived surrounded by rules, but kept a wary eye on them, and recklessly broke them himself once in a while if he felt the urge. In the article that follows, Ved Mehta, who was a staff writer at The New Yorker for thirty-three years, describes the romantically American background from which Shawn came. -- I. F.

"The New Yorker's Mr. Shawn" is not available online. It can be found on page 72 of the print edition of the April, 1998, Atlantic Monthly.

Sobre a repórter Eliane Brum

Do Novo em Folha:

Apesar de se dizer briguenta, Eliane Brum, repórter especial da "Época", fala baixinho, bem devagar, com a voz frágil.

E ela começou a palestra sobre a "extraordinária vida comum", no Congresso da Abraji, dizendo que o repórter deveria ir à rua em busca da fragilidade e da delicadeza dos outros.

Para ilustrar sua posição, a repórter leu, para uma sala sem lugares vazios, um monte de crônicas e reportagens que escreveu desde os tempos de "Zero Hora". Falou, por exemplo, da incrível galinha detida em atitude suspeita.

Permeando essas histórias, ela soltou alguns pensamentos que achei muito interessantes e anotei para compartilhar com vocês:

* Nós, jornalistas, construimos um documento diário, um relato da nossa vida contemporânea, da nossa sociedade. Se fazemos de forma mal feita, preguiçosa, reduzimos nosso lugar no mundo e, de forma criminosa, deixamos para a posteridade uma história distante da realidade.

* Nós reproduzimos uma das visões de mundo, uma das verdades. Determinamos quem deve ser visto e quem não deve. Com isso, a mídia, através de nós, mantém desigualdades. Não podemos ser ingênuos.

* Um repórter deve aprender a olhar e a escutar. Inclusive os "desacontecimentos" e os anônimos.

* Cada vez mais se faz matéria por telefone ou e-mail. É preciso resistir à pressão do chefe. Ir para a rua é a melhor coisa para um repórter.

* O real é complexo e temos a obrigação de reproduzir essa complexidade, com todas as suas palavras – mas também com os gestos, os silêncios, os cheiros, as cores, as texturas. Se entrevistamos por telefone, podemos reproduzir só as palavras, só as aspas. Com isso, reduzimos o mundo.

* É preciso anotar tudo o que está acontecendo durante a entrevista – não só as palavras – para reconstruir toda a complexidade depois. As pessoas falam também com o corpo.

* Mais importante que saber perguntar é saber escutar a resposta. O pior repórter é o que termina a frase pela pessoa, interrompe para completar ou porque acha que a pessoa não está dizendo o que ele quer ouvir. "Tenho aprendido a perguntar cada vez menos e ouvir cada vez mais." A pergunta já impõe nossa narrativa, dá uma linha. Temos que deixar a pessoa começar pelo que ela acha que é o começo e deixar contar o que quer contar.

* É preciso respeitar a palavra exata. A escolha que o entrevistado faz de cada palavra já é, por si só, informação importante.

* O espanto é o melhor da nossa profissão. "Sou pautada pela obrigação de olhar e estar aberta para o espanto."

* Nunca resistam a rodinhas de pessoas. Cheguem lá pra ver de que se trata. Deve ser pauta.

* Repórter não pode nem ser blasé, nem burocrático. Na rua, quem manda no repórter é ele mesmo.

* É preciso saber brigar e argumentar com o editor.

* Para escrever um texto prazeroso, não basta vomitar palavras. É preciso apurar, cuidar da precisão, da mesma forma que em qualquer texto jornalístico. Para escrever "fazia sol", ela entrevistou cinco pessoas, pedindo que descrevessem o tempo na hora do acontecimento, e ainda consultou três meteorologistas.

* Converse com o fotógrafo que te acompanha na pauta, troque idéias, acompanhe até o fim o trabalho dele.

* Temos a obrigação de proteger nossos entrevistados. A maioria não tem noção de como a vida vai mudar depois que a matéria for publicada.

* É bom já chegar com o bloquinho, ser o mais transparente possível durante as entrevistas, e gravar todas as conversas.

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"Fui tomada pela perplexidade quando a repórter especial Eliane Brum, da revista "Época", começou sua palestra no congresso da Abraji. Em meio a palestrantes-jornalistas sempre 'tensos', dominados pelo entusiasmo de grandes investigações e furos nacionais de reportagem, Eliane parecia vir de outro planeta.

Ela conduziu a palestra 'Jornalismo sobre a extraordinária vida comum' lendo, em voz suave e interpretada, histórias de personagens que havia conhecido em sua carreira. Entre uma leitura e outra, lembrava da importância de procurar entender, como repórter, o que dá sentido à vida das pessoas – e colocar isso no papel.

Eliane Brum, definitivamente, tem uma relação diferente com o jornalismo, distante das obsessões dos furos e dos grandes temas nacionais. Ela encara a profissão como uma missão: para ela, ser repórter é um jeito de estar no mundo, e empobrecê-lo é criminoso.

O mais interessante é que não são posturas inconciliáveis com o hard news: saber tratar temas com profundidade, saber ouvir, ter responsabilidade com o que escrevemos é comum (ou deveria ser) tanto a jornalistas como Eliane Brum quanto àquele que cobre o buraco da rua tal."